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13 de fev. de 2011

Exercícios e a FM

Influência de uma sessão de exercício em esteira sobre a 
sintomatologia e a intensidade dolorosa de portadoras de fibromialgia

  
Laboratório de Investigação e Estudos
sobre Metabolismo e Exercício Físico (LIEMEF)
Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do
Mato Grosso (FAPEMAT 565/04)
Universidade Federal de Mato Grosso 
 
 
Marcia Aparecida Prando
Prof. Dr. Gustavo Puggina Rogatto 

gustavorogatto@yahoo.com.br 
(Brasil) 
 

 

 

 

 
Resumo
    O objetivo do presente estudo foi verificar os efeitos agudos de uma sessão de exercício aeróbio em esteira sobre a condição dolorosa e a identificação de "tender points" durante e após a atividade. Fizeram parte da amostra seis mulheres sedentárias com idades entre 30 e 60 anos, diagnosticadas previamente com fibromialgia não associada à outra enfermidade e não submetidas a tratamento medicamentoso para controle de dor. As participantes foram submetidas a uma sessão de exercício em esteira com duração de 60 minutos e intensidade correspondente a 50% da FCmáx. Previamente a sessão de exercício (T0), as voluntárias foram submetidas a uma avaliação para a identificação dos "tender points" e para a quantificação da intensidade dos sintomas dolorosos (pela "Escala Visual Analógica de Dor" - EVAD, amplitude: 0-100). Os mesmos parâmetros foram avaliados aos 15 (T15), 30 (T30), 45 (T45) e 60 minutos (T60) de exercício. Nos mesmos tempos, também foram avaliadas as sensações e sintomas ocorridos durante o teste. Embora não tenha ocorrido alteração significativa do nível de dor das participantes durante a realização da sessão de esforço, observou-se, nos 30 minutos iniciais de atividade, uma tendência a aumento da intensidade dolorosa avaliada pela EVAD. Nos 30 minutos subseqüentes a resposta a EVAD foi inversa, ou seja, apresentou tendência à redução. No que diz respeito à identificação dos "tender points", observou-se que na condição de repouso, 83,3% dos voluntários apresentavam sintomatologia dolorosa no "tender point" da região correspondente ao músculo trapézio. Durante a sessão de esteira a identificação dos "tender points" foi a seguinte: T15: trapézio, cervical e articulações do joelho e cotovelo; T30: trapézio, lombar e joelhos; e T45: trapézio. Esse resultado indica aumento do número de "tender points" ao longo da sessão de esforço. Contudo, ao final da sessão (T60), 66,6% das voluntárias relataram ausência de "tender points". Conquanto a intensidade dolorosa, avaliada pelo EVAD, não tenha sofrido modificação significativa durante os 60 minutos de exercício em esteira, observou-se, que ao final da sessão, a incidência de pontos dolorosos diminuiu, indicando que o exercício aeróbio de baixa intensidade pode ser uma ferramenta útil no tratamento da dor característica da síndrome fibromiálgica. 
    Unitermos: Fibromialgia. Exercício físico. Dor. 
 

 
http://www.efdeportes.com/ Revista Digital - Buenos Aires - Año 10 - N° 94 - Marzo de 2006

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Introdução

    A dor crônica freqüentemente é debilitante e atinge milhões de brasileiros de forma devastadora, afetando a qualidade de vida de muitas pessoas. O sofrimento decorrente da dor pode desestruturar a vida de uma pessoa em vários aspectos, sendo eles físico, social e psicológico. Pessoas atingidas por esse mal passam constantemente por instabilidades emocionais, sofrendo desde uma simples irritabilidade até estados de depressão profunda. A condição dolorosa interfere na qualidade de vida, uma vez que prejudica o rendimento no trabalho, em casa e também provoca problemas de relacionamentos com familiares e pessoas próximas.

    Segundo Goldenberg (2000), entre 10% e 12% da população geral sofrem de dores crônicas disseminadas, sendo que as mulheres são as maiores vítimas.

    Entre as várias doenças caracterizadas pela dor, uma tem se destacado nos últimos anos por sua peculiaridade em relação à diversificação de sintomas e à intensidade. Trata-se da chamada fibromialgia.

    A fibromialgia é uma síndrome que atinge principalmente mulheres entre 30 e 60 anos (estima-se que elas representam aproximadamente 90% dos casos). Esta maior incidência no sexo feminino tem sido avaliada por alguns estudos que sugerem a possibilidade da relação entre a doença e as mudanças hormonais decorrentes do envelhecimento biológico (Teixeira e Figueiró, 2001). No Brasil, ainda não existe um levantamento oficial, mas estima-se que pelo menos 5% da população seja portadora desta síndrome (Castro, 2000). O difícil diagnóstico e a falta da procura por médicos especializados, são fatores que comprometem a exatidão de informações sobre o número de portadores desta enfermidade.

    A fibromialgia foi classificada em 1990 pelo Colégio Americano de Reumatologia durante um simpósio médico internacional. Na ocasião foi idealizada a publicação de um protocolo para o diagnóstico desta síndrome. Antes de sua identificação, as queixas de seus sintomas não eram diagnosticadas como sendo as de uma doença física, estando mais ligada a distúrbios de ordem psicológica. Após esta data, vários critérios foram adotados mundialmente para o diagnóstico específico da doença.

    Vários sintomas são relatados, porém a dor é o mais freqüente, uma vez que compromete a qualidade de vida do doente. A maioria dos pacientes se sente impossibilitada de combater estes sintomas, sofrendo com as dores e com a incerteza da cura, ainda não encontrada. Os medicamentos existentes servem apenas para amenizar os sintomas, causando mais angústias e desordens psicológicas.

    Algumas pesquisas têm explorado meios alternativos para o tratamento da fibromialgia (Goldenberg, 2000; Pereira e Esteves, 2002; Richards e Scott, 2002). O exercício físico é um dos métodos que, ao longo de anos de pesquisas, vêm apresentando bons resultados no controle da doença (Valim, 2001). Indiscutivelmente sabemos que a atividade física tem um papel fundamental no que diz respeito à qualidade de vida, propiciando bem estar físico e mental por meio da liberação de vários hormônios, aumentando a expectativa de vida e/ou servindo como válvula de escape para as tensões diárias (Nahas, 2003). Além destes benefícios, o exercício também pode ser usado como um meio preventivo de desordens orgânicas (Nieman, 1999).

    Vários estudos têm sido desenvolvidos com o intuito de se investigar os efeitos da atividade física sobre o alívio ou cura de algumas doenças ou seus sintomas (Nieman 1999). Em tempos remotos poupavam-se os doentes de esforço físico, acreditando-se que este poderia ter um papel comprometedor no processo de cura, uma vez que um gasto maior de energia estaria sendo desperdiçado ao invés de estar sendo aplicado no combate à doença. A indústria farmacológica investe milhões em pesquisas com o propósito de encontrar o medicamento mais eficaz para cada tipo de doença. Por outro lado, poucos investimentos são destinados às campanhas de conscientização sobre hábitos saudáveis que colaboram com a boa saúde global.

    Vários estudos têm sido desenvolvidos visando à busca de tratamentos mais eficazes para o controle dos sintomas oriundos da SFM, sendo eles medicamentosos, psicológicos e fisiátricos. Dentre as pesquisas sobre tratamento fisiátrico, denominadas como terapias físicas, as mais citadas são a acupuntura, a massagem, a estimulação transcutânea, a cinesioterapia, o biofeedback entre outros (Goldenberg, 2000; Hanson, 1998; Teixeira, 2001). Contudo, poucos trabalhos têm sido desenvolvidos sobre os efeitos do exercício físico aeróbio no tratamento da fibromialgia.


Objetivo

    Verificar os efeitos imediatos do exercício sobre a condição dolorosa, os pontos dolorosos e as sensações dos sintomas da doença, antes, durante e após uma sessão de exercício aeróbio em esteira em pacientes fibromiálgicos.


Materiais e métodos

Participantes

     Participaram da pesquisa 6 pacientes do sexo feminino, portadores da Síndrome fibromiálgica e com idade entre 30 e 60 anos. Como critério de inclusão no estudo, as voluntárias não deveriam estar participando de programas de exercícios físicos ou sendo submetidas a tratamento medicamentoso.

Exercício agudo (caminhada em esteira)

    Todas as voluntárias foram submetidas a uma sessão de caminhada em esteira ergométrica com inclinação de 0%. A velocidade do ergômetro foi ajustada de acordo com a intensidade correspondente a 50% da freqüência cardíaca máxima (FCmáx). A sessão de exercício teve a duração de 30 minutos. O controle da intensidade foi feito por meio de freqüencímetro da marca POLAR (modelo M62).

Avaliações

    Previamente à sessão de esforço (T0) e aos 15 (T15) e 30 minutos (T30) de caminhada, todas as participantes foram submetidas às seguintes avaliações: 1) identificação da intensidade de dor (por meio do "Questionário visual analógico de dor"), 2) identificação dos "tender points", 3) identificação das sensações, e 4) identificação dos sintomas ocorridas durante os 30 minutos de esforço. Posteriormente à sessão de exercício, as pacientes foram novamente submetidas às quatro avaliações aos 15 (T45) e 30 minutos (T60) imediatamente após a sessão de caminhada.

Questionário Visual Analógico de Dor (QVAD)

    Utilizado para a identificação da intensidade de dor, o questionário é caracterizado por uma escala de 0 a 100, onde o 0 corresponde à ausência total de dor e 100 ao pico de dor, denominado dor insuportável. Numa linguagem mais fácil, cada numeração é representada por ilustrações que retratam visualmente a sensação de dor pela qual o paciente está passando. Quanto maior o número indicado, maior a expressão de sofrimento. O paciente indicava a ilustração no QVAD que mais se enquadra a sua condição de dor nos cinco momentos do teste (T0, T15, T30, T45, T60).

Identificação de tender points

    Com todos os pacientes diagnosticados por um médico especialista (constatando a presença de onze ou mais pontos dolorosos), foi orientado a cada voluntário que, durante a realização do teste (antes, durante e depois da sessão de caminhada: T0 a T60), fosse relatado desconforto ou processo doloroso em um ou mais dos pontos dolorosos que se seguem:

  • Occipital (inserção do músculo occipital);

  • Cervical baixa (face anterior no espaço intertransverso de C5-C7);

  • Trapézio (ponto médio da borda superior);

  • Segunda costela (junção da segunda costocondral);

  • Supraespinhoso (acima da borda medial da espinha da escápula);

  • Epicôndilo lateral (a 2cm do epicôndilo);

  • Glúteos (quadrante lateral e superior das nádegas);

  • Grande trocanter (posterior à proeminência trocantérica);

  • Joelho (região medial próxima à linha do joelho).


Identificação de sintomas e sensações

    Os voluntários foram consultados antes, durante e após o exercício (T0, T15, T30, T45, T60) sobre os sintomas da SFM e as sensações ocorridas durante o experimento. Para a identificação dos sintomas da SFM, foi apresentada ao paciente uma listagem de sintomas da doença, que ele deveria assinalar de acordo com a incidência no momento. Também foi feita a identificação das sensações ocorridas durante o teste por consulta aos voluntários que deveriam relatar sensações (que não faziam parte dos sintomas da doença) que eles estivessem sentindo no exato momento.


Análise dos resultados

    As identificações dos "tender points", das sensações e dos sintomas foram analisadas quanto à freqüência de respostas dos voluntários. A intensidade de dor, avaliada pelo QVAD, foi analisada por ANOVA e teste post hoc de Newman Keuls. O nível de significância foi pré-fixado em 5%.


Resultados e discussão

    A fibromialgia é caracterizada por dores músculo-esqueléticas não inflamatórias, espalhadas por todo o corpo, incluindo pontos específicos de sensibilidade à dor, acrescida de vários sintomas.

    A palavra fibromialgia foi criada para expor várias condições desta síndrome. Fibro é derivado do latim e significa ligamentos, tendões, tecido fibroso. O radical mio vem do grego e significa tecido muscular. Ainda do grego, algos significa dor e ia uma condição. Portanto, fibromialgia significa uma condição dolorosa que provém de tendões, ligamentos e músculos. É considerada uma síndrome por ser caracterizada por um conjunto de sintomas e não somente uma má função específica, manifestando-se diferentemente em cada indivíduo, sendo assim conhecida como síndrome fibromiálgica (SFM).

    Vários sintomas da SFM também são encontrados em outras doenças. Por isso, ela pode ser facilmente confundida com outras enfermidades. Em decorrência disto, faz-se necessária uma forte investigação, uma vez que a SFM não apresenta alterações em exames de imagem e laboratoriais, ficando a cargo de um especialista o seu diagnóstico (através de uma investigação rigorosa, descartando a possibilidade de outras doenças).

    Para Hanson (1998), a SFM é dividida em duas categorias, a primária, onde o indivíduo não apresenta outra patologia concomitante e a secundária, onde existe a SFM em associação a qualquer outra doença.

    Segundo os critérios do Colégio Americano de Reumatologia, para a classificação da SFM (Wolfe et al.,1990), a dor crônica incapacitante é o sintoma mais freqüente desta síndrome. A dor relatada usualmente é generalizada e se apresenta em uma escala de maior ou menor intensidade, podendo variar de acordo com o clima, hora do dia, inatividade, qualidade do sono e estresse. A condição dolorosa tem picos de incidência durante alguns meses, podendo amenizar e surgir novamente. Outro fator importante e decisivo para a sua classificação são os denominados "tender points". Estes são pontos pré-determinados de sensibilidade à dor, espalhados por todo o corpo em locais específicos. Ao todo são 18 os pontos pré-determinados. A doença pode ser diagnosticada, se pelo menos 11 deles estiverem doloridos ao serem pressionados e se a condição dolorosa persistir por um período maior que três meses. Tais pontos são encontrados nas junções entre nervo e músculo e estão localizados bilateralmente nas seguintes regiões: occipital, cervical baixa, trapézio, segunda costela, supraespinhoso, epicôndilo lateral, glúteos, grande trocanter e joelho.

    Além da dor e dos pontos dolorosos, também são sintomas comuns da fibromialgia a rigidez e a fadiga muscular por todo o corpo, cefaléia, dismenorréia, adormecimento e inchaço nos membros. Em alguns casos, ocorre um desconforto abdominal e na maioria deles, o distúrbio do sono. O fibromiálgico não consegue completar a quarta fase do sono, que é quando ocorre o relaxamento completo da musculatura, enfrentando noites mal dormidas e despertando freqüentemente durante a noite. O sono geralmente não é reparador, fazendo com que o doente acorde com dores no corpo, sentindo cansaço. Além destes sintomas, também é encontrado déficit de memória e concentração.

    No presente estudo, quando questionados sobre as sensações ocorridas durante o teste, pode-se perceber que no tempo 0 a maioria dos participantes relatou não estar sentindo nenhuma sensação. No tempo 15, quando questionados sobre as sensações, observou-se que as queixas mais comuns foram calor (queimação), tontura e cansaço. No tempo 30, momento em que o exercício físico foi encerrado, continuaram prevalecendo as queixas de cansaço e dores. No período pós-exercício, isto é 45 minutos de teste, percebeu-se mudanças em relação às sensações relatadas durante o exercício, sendo constatada diminuição das dores e uma sensação de bem-estar (relaxamento). No T60, a sensação de bem-estar continuou a ser observada.

    Tornou-se evidente que antes de iniciar o teste existiu uma predominância de ausência de sensações, e que no decorrer do teste durante os 30 minutos de caminhada em uma intensidade moderada, desconfortos como calor, dores e cansaço aumentaram, havendo um ápice da quantidade de sensações no minuto 30, momento de encerramento do exercício. Por outro lado, num segundo momento, o período pós-exercício, as sensações de bem estar e relaxamento aumentaram.

    Dependendo da intensidade, o exercício físico pode apresentar um efeito analgésico, uma vez que estimula a liberação de hormônios como endorfina na corrente sanguínea durante o esforço, propiciando ao indivíduo uma sensação de bem-estar. O exercício eleva temporariamente a temperatura corporal e induz o corpo a um relaxamento, tranqüilizando o seu praticante. DeVries e Adams apud Sharkey (1998) citam um estudo comprovando que uma simples sessão de exercício (caminhada) foi tão eficaz na redução da tensão quanto um medicamento, sendo que o efeito do exercício foi mais duradouro que o do fármaco.

    Quanto à variedade de sensações relatadas pelas diferentes participantes durante o exercício, fica clara a diversidade de sensações apresentadas, coincidindo com vários estudos que relatam vários tipos de sensações em diferentes indivíduos (Scotton e Fraga, 2000). Independente das queixas observou-se que o número de sensações diminuiu ao final do teste, sendo que em alguns casos ocorreu o desaparecimento das queixas.

    O quadro 1 mostra a identificação dos sintomas da enfermidade durante a realização do teste. Pode-se constatar que no tempo 0 foi unânime o relato de ausência de sintomas da doença. Porém, no minuto 15 a maioria cita dois sintomas concomitantes. Dentre os sintomas citados, os que mais apareceram foram: fadiga, dor de cabeça, e retenção hídrica (inchaço). Aos 30 minutos permaneceu o relato dos dois sintomas na maior parte dos pacientes: fadiga e dor de cabeça. Quinze minutos após o término do exercício (T45), houve uma diminuição dos relatos de sintomas. No último instante do teste (T60), quando questionadas sobre os sintomas, apenas uma paciente se queixou da presença de um sintoma. Todas as outras relataram ausência total de sintomas.

    A fibromialgia se destaca pela diversificação e quantidade de sintomas. Porém, todos os sintomas citados durante o teste estão diretamente relacionados ao exercício, ou seja, ocorrem devido às modificações orgânicas por interferência cardiorrespiratória, circulatória ou metabólica.

    Como constatado no presente estudo, a fadiga está presente na maioria dos casos. Em estudos prévios, este sintoma foi referido por mais de 85% dos doentes (Kaziyama, Yeng, Teixeira, 2001), e pode ser caracterizado desde uma sensação de cansaço até a exaustão extrema (Hanson, 1998). Se a fadiga já está presente no estado de repouso, em pacientes fibromiálgicos, esta se torna mais intensa e até desconfortante durante o exercício, onde a demanda de troca gasosa nas células musculares é bem maior. Segundo Sabbag et al (2000), portadores de SFM que realizaram testes ergométricos interrompem precocemente o teste, principalmente por dor muscular e exaustão física.

Quadro 1. Sintomas identificados antes, durante e depois da sessão de caminhada em esteira. 

    Em se tratando de dores de cabeça (relatadas mais freqüentemente na parte frontal) e retenção hídrica (localizada nas mãos e pés), pode-se especular a relação destes sintomas com a presença de problemas circulatórios. A diminuição de oxigênio muscular em pontos dolorosos na fibromialgia (Kaziyama, Yeng, Teixeira, 2001) pode ser a causa do aumento da circulação nas extremidades corporais durante o exercício, o que pode ter causado inchaços momentâneos.

    O quadro 2 apresenta os tender points identificados ao longo dos testes. Percebeu-se claramente que a presença do ponto doloroso mais freqüente na maioria dos portadores de fibromialgia, localiza-se nas regiões cervical e torácica superior, mais especificamente no músculo trapézio. No momento inicial (T0), isto é antecedendo o período do exercício, um dos pontos dolorosos já se mostravam presentes em todos os pacientes participantes. Nos T15 e T30, continuaram os relatos de incidência dolorosa na região cervical e do trapézio, além daquelas ocorridas de outros pontos (joelho, lombar, cotovelo). Após a sessão de caminhada (T45), houve uma diminuição da incidência de dor em algumas pacientes, sendo que no minuto 60, a maioria das voluntárias relatou ausência de pontos dolorosos.

Quadro 2. tender points identificados antes, durante e depois da sessão de caminhada em esteira. 

    Constatou-se que, no início do teste todas as pacientes sentiam dores leves ou moderadas na região do trapézio e que com o exercício este quadro de dor aumentou. Contudo, com o término da atividade, nos momentos seguintes houve uma melhora no referido fator. É importante destacar que dentre os pontos dolorosos espalhados por todo o corpo na fibromialgia, a região cervical se destaca pela presença de 3 pontos bilaterais espalhados ao longo da musculatura do trapézio. Ao todo são 6 pontos dolorosos muito próximos que se difundem no momento de percepção à dor, sofrendo uma maior concentração dolorosa em uma região específica. Outro fator importante da dor, presente nesta região, pode estar ligado à tensão muscular que esta musculatura sofre sob condições de pressão. Segundo Baccaro (1991), a tensão muscular é um dos grandes sintomas do estresse. Considerando que uma grande parte da população fibromiálgica também sofre com os males do estresse, este pode ser um fator contribuinte para o aumento da tensão muscular e da dor no referido local.

    Bengtsson et al. apud Kaziyama, Yeng, Teixeira (2001) registraram decréscimo significativo dos níveis de ATP (trifosfato de adenosina), ADP (difosfato de adenosina) e creatina-fosfato no músculo trapézio de doentes com SFM. Estes componentes exercem papéis muito importantes na contração e relaxamento da musculatura. Outro fator interessante, observado pelo estudo de Famaey et al. apud Marques (2002), foi a presença de um padrão de tetania latente e uma redução da habilidade de relaxamento do músculo dos portadores SFM. Outro estudo que comprova esta hipótese relatou que ao medir a concentração do oxigênio no centro de pontos-gatilhos (tender points), resultados preliminares indicaram um déficit significativo deste componente nestas regiões corporais (Simons apud Chaita, 2001). Todos estes fatores contribuem para o aumento da dor na região do trapézio, porém fica comprovado pelo presente estudo que uma sessão de exercício físico contribui para a diminuição momentânea deste sintoma de dor.

    A tabela 1 apresenta o comportamento da intensidade de dor dos 6 pacientes durante o teste nos tempos 0, 15, 30, 45 e 60 minutos. O comportamento visual da intensidade de dor durante o teste pode ser observado na figura 1 onde é apresentada a variação média do grupo durante a coleta dos dados.

Tabela 1. Resultados individuais e médios (± desvios padrões) da intensidade do nível de dor das pacientes antes (T0), durante (T15) e após (T30, T45 e T60) a sessão de caminhada em esteira. 

    Embora não tenham sido encontradas diferenças estatisticamente significativas, observou-se que a condição dolorosa das pacientes sofreu tendência a alterações durante todo o teste. É importante observar que todas as pacientes já apresentavam algum processo doloroso antes de iniciar o teste. O pico de incidência dolorosa ocorreu aos 30 minutos, momento em que o exercício físico foi encerrado. Nos momentos posteriores ao esforço, isto é, no T45, os níveis de dor tenderam a uma redução. Quando questionados no minuto 60 (T60), a maioria das voluntárias apresentou tendência à diminuição dos níveis de dor, aquém dos níveis anteriores ao exercício (T0).

    O descondicionamento físico é uma característica dos portadores da síndrome fibromiálgica e exerce papel importante na expressão dos sintomas, predispondo os doentes a microtraumatismos musculares, dor e fadiga crônica (Hanson, 1998; Kaziyama, Yeng, Teixeira, 2001).

    A dor específica, que acompanha algum tipo de traumatismo nestes doentes, pode evoluir para dor generalizada. Por este motivo muitas investigações são feitas com o intuito de se descobrir anormalidades musculares como causa da doença. 


Figura 1. Percepção de dor antes, durante e após a realização de 30 minutos de caminhada em esteira (média das seis participantes do teste).

    Alterações como atrofia das fibras musculares, ineficiência no transporte de oxigênio e comprometimentos metabólicos no processo de contração muscular, são responsáveis por uma maior produção de ácido láctico, que diminui a contratilidade muscular. Com isso, observa-se fadiga e conseqüentemente dores musculares (Valim, 2001). Hanson (1998) confirma esta condição ao afirmar que o consumo de oxigênio no músculo desses pacientes ocorre em hipóxia, que acontece devido a um controle defeituoso do fluxo sanguíneo a nível celular, alterando o transporte de oxigênio no músculo esquelético. Como resultado, acontece uma redução do suprimento de oxigênio, fazendo com que o material de excreção celular não seja eliminado adequadamente, conseqüentemente levando à fadiga e dor durante o exercício.

    Outro fator freqüentemente presente em pacientes fibromiálgicos é a diminuição dos níveis de aminoácidos no sangue e anormalidades estruturais musculares, responsáveis pela reparação muscular normal. Este desequilíbrio pode atrasar o processo de cicatrização de um microtrauma induzido pelo exercício, causando sintomas dolorosos nos músculos (Hanson,1998).

    Considerando que estes pacientes sofrem de uma maior sensibilidade dolorosa, todo e qualquer tipo de atividade física, de intensidade leve a moderada, pode trazer alterações significativas no processo da dor, como afirma Hanson (1998:293) ao dizer que "... as fibras envolvidas na transmissão e sensação de dor nos músculos esqueléticos têm um limiar relativamente alto ao estímulo normal. Na presença de neurotransmissores, como a serotonina, estas fibras tornam-se hipersensíveis a estímulos repetitivos ou nocivos e conseqüentemente transmitem dor a um baixo nível de esforço".

    Alguns estudos sugerem que os fibromiálgicos apresentam níveis de condicionamento físico mais baixos quando comparados com pessoas sedentárias sem fibromialgia (Valim et al, 1999). Desde que a dor pode ser aumentada durante a prática de atividade física, muitos pacientes tornam-se fisicamente inativos, piorando seu estado geral (Mengshoel, 1996).

    Pesquisas sobre os efeitos do exercício físico em portadores de fibromialgia evidenciam resultados positivos (Karper, 2002). Dentre as modalidades de exercícios (aeróbio, alongamento e resistência muscular) como alternativa eficaz no tratamento da fibromialgia, o condicionamento aeróbio tem se mostrado superior (Richards, 2002; Valim, 2001). Desta maneira, o exercício aeróbio, como a caminhada, pode promover uma maior analgesia em relação às dores musculares. Porém, Pollak (1999) adverte que o grande agravante deste tipo de tratamento é que, especialmente nas fases iniciais, o exercício pode piorar a dor e a fadiga, fazendo com que os participantes desistam precocemente da atividade. Este fato, de aumento do nível de dor no início do esforço, coincide com os achados do presente estudo.


Conclusão

    Através dos resultados obtidos neste estudo, pode-se afirmar que durante o exercício aeróbio de intensidade moderada, o quadro da síndrome fibromiálgica, baseado nos sintomas, sensações e tender points, tende a apresentar influências negativas. Contudo, após a realização do exercício, nos 30 minutos subseqüentes, os níveis de sintomas, sensações e tender points, retornaram aos níveis iniciais ou até mesmo apresentaram-se inferiores aos valores de base (como no caso dos tender points).


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